foto de divulgação
O Ministério Público Federal (MPF) no Rio Grande do Norte denunciou os
ex-presidentes da Câmara dos Deputados Henrique Eduardo Lyra Alves e Eduardo
Consentino da Cunha, além de outros quatro envolvidos no esquema de corrupção,
lavagem de dinheiro e organização criminosa investigado na Operação Manus,
deflagrada no último dia 6 de junho e que deriva da Operação Lava Jato. A
denúncia foi entregue à Justiça Federal nesta terça-feira (20).
Eduardo Cunha já se encontrava no Complexo Médico Penal do Paraná,
quando a Justiça Federal, a pedido do MPF no RN, acatou um novo mandado de
prisão preventiva contra ele e Henrique Alves. Este, por sua vez, foi preso
pela Polícia Federal em sua residência, em Natal, e se encontra atualmente
custodiado na Academia de Polícia Militar do Rio Grande do Norte.
Além dos dois, também foram denunciados pelo MPF José Adelmário Pinheiro
Filho, o “Leo Pinheiro”, presidente da OAS e que está preso na Polícia Federal,
no Paraná; o executivo da Odebrecht Fernando Luiz Ayres da Cunha, que vem
colaborando com as investigações; o empresário e ex-secretário de Obras de
Natal, Carlos Frederico Queiroz Batista da Silva, conhecido como “Fred
Queiroz”, atualmente preso no Quartel da PM, em Natal; e o empresário Arturo
Silveira Dias de Arruda Câmara, sócio da Art&C Marketing Político Ltda.,
com sede na capital potiguar.
Provas – A denúncia do MPF reúne
mensagens de celulares, prestações de contas eleitorais, dados bancários e
telefônicos, depoimentos testemunhais, diligências de campo, documentos e
depoimentos de colaborações premiadas. Esse conjunto confirma as ilegalidades
cometidas pelo grupo. Para o MPF, entre Eduardo Cunha e Henrique Alves existia
uma “parceria criminosa”.
De acordo com a denúncia, os dois ex-parlamentares, pelo menos entre
2012 e 2014, “solicitaram, aceitaram promessa nesse sentido e efetivamente
receberam vantagens indevidas, de forma oculta e disfarçada, por meio de
doações eleitorais oficiais e não oficiais, em razão da atuação política e
parlamentar de ambos em favor dos interesses de empreiteiras”.
Por sua vez, Fred Queiroz - administrador de fato da Pratika Locação de
Equipamentos e aliado do ex-ministro Henrique Alves - e o cunhado do
ex-parlamentar, Arturo Arruda Câmara, contribuíram com a “estrutura organizada
para lavagem, por meio de prestações de contas eleitorais, dos valores
ilicitamente obtidos”. Esquema utilizado principalmente na campanha de Henrique
ao Governo do Rio Grande do Norte, em 2014.
Favores – Alguns dos “favores” feitos
pelos ex-deputados à OAS, em troca das propinas, são detalhados na denúncia e
ocorreram “em especial no ano de 2013, por meio da superação de restrições à
participação da empresa na privatização dos aeroportos do Galeão e de Confins,
por meio da aprovação do projeto da Lei Complementar n. 283/2013, referente à rolagem
da dívida pública do Município de São Paulo, e da superação de entraves à
liberação de financiamento do BNDES relativo à obra da Arena das Dunas, em
Natal/RN.”
Para o Ministério Público Federal, disfarçar a propina por meio de
doação eleitoral foi uma das estratégias mais usadas. Em junho de 2012,
ainda antes do período de campanha, foram pagos R$ 700 mil pela OAS, por meio
do Diretório Nacional do PMDB, sempre com aval de Léo Pinheiro.
Ainda da OAS, veio repasse de mais R$ 500 mil em 13 de agosto do mesmo
ano, através do Diretório Nacional. Até setembro chegaram mais R$ 1 milhão e
posteriormente mais R$ 500 mil para a dupla, pelo mesmo caminho. Já em
outubro, outros R$ 500 mil. Entre junho e setembro, dessa vez em 2014, o MPF
registra repasses de R$ 650 mil e de R$ 3 milhões, através da conta de campanha
ou pelo Diretório do PMDB no Rio Grande do Norte.
Odebrecht – Em outubro de 2014 houve nova
solicitação de propina, por parte dos ex-parlamentares. A Odebrecht, dessa vez,
foi quem repassou pelo menos R$ 1 milhão, através do Diretório Nacional e
Estadual. Eram “valores devidos pela OAS, mas, em razão da afirmativa de 'Léo
Pinheiro' de que não era viável a realização do pagamento naquela ocasião, as
quantias acabaram sendo solicitadas à Odebrecht, para posterior compensação
entre as empreiteiras.”
Nem todos os valores pagos pela Odebrecht, contudo, foram para “quitar”
dívidas da OAS com os parlamentares. Em troca de interesses da própria
Odebrecht, os ex-presidentes da Câmara receberam, de agosto a outubro de 2014,
R$ 2 milhões em “caixa dois”, valor acertado com Fernando Luiz Ayres, “em razão
da promessa de privatização da Companhia de Água e Esgoto do Rio Grande do
Norte, operação na qual havia interesse da empreiteira em realizar
investimento”.
Carioca e Andrade Gutierrez -
De junho a outubro do mesmo ano, outros R$ 400 mil foram repassados pela
Carioca Engenharia, através de doações eleitorais oficiais feitas à conta de
campanha de Henrique Alves. Eduardo Cunha já vinha agindo em prol dos interesses
da Carioca, em especial entre os anos de 2011 e 2013, por meio da obtenção de
financiamento perante a Caixa Econômica para obras do Porto Maravilha, no Rio
de Janeiro. Em função dessa “ajuda”, os dois ex-deputados receberam propina no
exterior, “fato que já é objeto de ação penal própria”.
A Andrade Gutierrez, por sua vez, doou ao Diretório do PMDB no RN R$
1,25 milhão entre julho e setembro de 2014, dos quais R$ 100 mil foram
diretamente para a conta de campanha de Henrique Alves. “Os valores consistiram
em contrapartida pela atuação de Eduardo Cunha na alteração da redação da
Medida Provisória n. 627/2013, que tratava da tributação do lucro de empresas
brasileiras no exterior, de modo que o texto final (…) contemplasse os
interesses da empresa, o que acabou de fato ocorrendo.”
Arena e clubes – No caso
da Arena das Dunas, a OAS necessitava de aval do Tribunal de Contas do Estado
(TCE/RN) para a liberação de novas parcelas do financiamento do BNDES para a
obra. Contudo, o tribunal não teve acesso ao projeto executivo completo e não
podia avalizar a liberação. Henrique Alves foi procurado pela empreiteira e se
dispôs a agir junto ao TCE e ainda a ir “pra cima do TCU”, o Tribunal de Contas
da União.
No Acórdão 1982/2013, o TCU comunicou ao TCE/RN que, “apenas em
situações em que fosse constatada irregularidade de gravidade suficiente, o
fato fosse comunicado ao BNDES”. Como o tribunal potiguar não tinha as
informações necessária para se posicionar sobre o assunto, o banco continuou a
liberar as parcelas e a obra foi concluída, com um superfaturamento de R$ 77
milhões.
O conselheiro relator do caso no TCE, Carlos Thompson Fernandes,
informou que Paulo Roberto Alves - então presidente do tribunal e primo de
Henrique Alves – declarou a ele em um conversa que o ex-deputado “o tinha
procurado em busca de informações sobre esse processo”. Em mensagens, Henrique
antecipou a Léo Pinheiro que falaria com o primo para buscar o aval do TCE.
“Ele [Henrique Alves], no mínimo, omitiu-se de seu dever funcional, como
parlamentar federal, de
fiscalizar a regular aplicação de recursos do BNDES, para, em vez disso,
favorecer interesses particulares de empreiteira”, reforça o MPF, acrescentando
que o ex-parlamentar ainda obteve vantagens indevidas da OAS no contrato
de utilização da Arena das Dunas, para as equipes do ABC Futebol Clube e do
América de Natal, que receberam, somente a título de “luvas”, o valor de R$ 2
milhões da empreiteira, cada uma.
Lavagem de dinheiro – Os valores que
chegavam para a campanha de Henrique Alves eram “lavados” através de um esquema
montado com empresários próximos do então candidato. Entre julho de 2014 e
fevereiro de 2015, ele, Fred Queiroz e Arturo Arruda usaram empresas
familiares, de aliados políticos e até de fachada para “justificar, ocultar e
dissimular, em prestação de contas eleitoral, a utilização de recursos de
origem e destinação ilícitas (em proveito pessoal, em compra de votos e de
apoio político)”.
Informações da Receita Federal e do Conselho de Controle de Atividades
Financeiras (Coaf) apontaram que, somente pela Pratika, transitaram mais de R$
9 milhões da campanha de Henrique Alves, dos quais R$ 5,5 milhões foram sacados
em espécie. A empresa está no nome da esposa de Fred Queiroz, Erika Montenegro
Nesi, e também teria recebido em suas contas parte da propina repassada em
dinheiro, via “caixa dois”, pela empreiteira Odebrecht.
A empresa serviu como instrumento para compra de apoio à campanha de
2014. Foram feitos repasses a 18 prefeitos, vereadores, lideranças políticas e
familiares de políticos do interior e da capital. Outros R$ 1,1 milhão tiveram
como destino a M N Queiroz Serviços e Eventos, empresa em nome de Matheus Nesi
Queiroz, filho de Fred e Erika: “o que evidencia o desvio de recursos em
benefício particular do grupo familiar em questão”, conclui o MPF.
Já para a Art&C Marketing Político Ltda., do cunhado Arturo Arruda,
a campanha do ex-ministro transferiu R$ 1,3 milhão, que teriam sido revertidos
em favor da família do candidato. “Arturo (…), juntamente com Carlos Frederico,
foi o grande artífice do esquema de lavagem de valores ilícitos por meio de
prestação de contas eleitorais na campanha de Henrique em 2014.”
Outras sete empresas de fachada receberam dinheiro da campanha.
“Paralelamente a isso, em diligência de busca e apreensão autorizada pelo STF
(...), foi arrecadada na residência de Henrique Alves em Natal/RN uma planilha
que retrata distribuição de valores a “lideranças” em sua campanha (...), o que
demonstra a efetiva prática de compra de votos.”
Crimes - Caso a denúncia seja aceita pela
Justiça Federal, os dois políticos irão responder por corrupção passiva (artigo
317, §1º, do Código Penal) e lavagem de dinheiro (artigo 1º, § 4º, da Lei n.
9.613/1998); Léo Pinheiro e Fernando Ayres por corrupção ativa e lavagem de
dinheiro; e os empresários Fred Queiroz e Arturo Arruda por lavagem de dinheiro
e organização criminosa (artigo 2º, § 4º, inciso II, da Lei n. 12.850/2013). Os
ex-deputados e os executivos da OAS e Odebrecht não foram denunciados por
organização criminosa porque já respondem por esse crime em outras ações.
O MPF requer ainda a reparação dos danos materiais e morais, no valor
mínimo de R$ R$ 15,5 milhões, e a decretação da perda da função pública para os
condenados detentores de cargo, emprego público ou mandato eletivo. O processo
tramita na Justiça Federal sob o número 0001430-69.2016.4.05.8400.
Confira a íntegra da denúncia clicando aqui.
Assessoria de Comunicação
Procuradoria da República no RN
Fones: (84) 3232-3960 / 3901 / 9119-9675
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