Conheça um pouco da história da ex-prefeita de Nova Cruz Joanita Torres Arruda Câmara
A prefeita Joanita Torres
Arruda Câmara foi eleita e assumiu a Prefeitura de Nova Cruz numa eleição
atípica em 1958. Entre o pleito e a posse houve um pequeno intervalo de menos
de trinta dias. A eleição foi no dia 06 de janeiro e a posse no dia 31.
Esse
fato ocorreu devido a uma correição determinada pelo Tribunal Regional
Eleitoral com o objetivo de evitar que até os “mortos votassem” como vinha
ocorrendo em pleitos anteriores. Como a correição atropelou o calendário
eleitoral as eleições seriam realizadas em 1957, foram adiadas para o ano
seguinte, ocorrendo quase à simultaneidade entre eleição e posse.
Por isso dona
Joanita e os prefeitos eleitos na época tiveram pouco tempo para preparar o
plano de governo e ainda tiveram pela frente, logo no início da gestão uma das
maiores secas do Rio Grande do Norte. Oposicionista ao Governo de Dinarte
Mariz, não conseguia qualquer tipo de ajuda, já que a preferência do governador
era pela assistência aos seus correligionários.
Nas poucas vezes que esteve em
Palácio, dona Joanita recebeu propostas de adesão ao governo em troca de
benefícios para o seu município, juntamente com seu marido, o deputado Lauro
Arruda Câmara. Pessedistas autênticos rejeitaram de imediato as propostas
adesistas.
Enfrentou a terrível seca daquele ano, comprometendo inclusive seu
patrimônio, enquanto aguardava os recursos do Governo Federal para atender aos
flagelados, que nunca chegavam ao seu destino até a criação da OPENE (Operação
Nordeste) naquele mesmo ano, que mais tarde veio a se transformar em Sudene, em
face dos apelos da classe política e da Igreja, através de um movimento
encabeçado por Dom Hélder Câmara, numa reunião do clero com o presidente
Juscelino Kubitschek, em Natal.
Com os parcos recursos do erário municipal e
com dinheiro próprio, assistiu a todos flagelados, de modo que nenhum deles
morreu de fome por falta de assistência. Os jardins da sua própria casa foram
utilizados para acolher flagelado que vinham da área rural, e lá se abrigava
para escapar da fome.
Ainda hoje o seu filho, Cid Arruda Câmara, prefeito de
Nova Cruz encontra pelo interior do município pessoas idosas que sobreviveram
àquela seca e dizem a ele “meu filho, quem me salvou foi mãe gorda”. Era assim
que dona Joanita era chamada pelos pobres. Uma das primeiras prefeitas do Rio
Grande do Norte, foi eleita para gerir os destinos de Nova Cruz(1958- 1963),
pela legenda do Partido Social Democrático (PSD), à qual se manteve fiel até a
sua extinção, em 1965, por ato de força do regime militar, imposto ao país, a
partir de 31/03/1964, no governo Castelo Branco.
Dona Joanita viveu numa época
em que as lideranças políticas pertenciam a partidos que fizeram história no
país, dentre eles o PSD, UDN, PTB, PDC, PSP, PTN e outros. As legendas UDN e
PSD arregimentavam as maiores lideranças do Estado em disputas memoráveis. Ela
e o marido Lauro Arruda Câmara foram líderes do PSD em Nova Cruz e adjacências,
enfrentando o udenista Djalma Marinho em campanhas acirradas e virulentas as quais
dividiram a cidade durante muitos anos, sob o clima de radicalismo político,
entre as duas facções em disputa renhida pelo poder. Sua atuação foi
reconhecida e sua memória reverenciada pelos conterrâneos.
Joanita Arruda é
nome do Centro Administrativo, de uma escola do CAIC e de uma creche na cidade
de Nova Cruz, terra em que viveu até o final dos seus dias, atendendo os que a
procuravam em sua loja ou na residência, onde almoçava em torno de 20 pessoas
quase todos os dias, além de fornecer remédios e assistência aos doentes.
Nasceu na Serra do Araruna, na Paraíba, e mudou-se para o Rio Grande do Norte
aos 13 anos, quando seu pai, o “coronel” Totô Jacinto, resolveu descer à
planície e atravessar a divisa entre os dois Estados, para radicar-se na
fazenda “Umbuzeiro”, no município de Nova Cruz. Instalou uma pequena prensa de
algodão, trazendo para ajudá-lo na luta a pequena Joanita. O pai tornou-se em
pouco tempo um dos maiores agropecuaristas da região.
Exercendo uma “função
ocupada por homem”, era encarregada de receber e pesar o algodão. Tomou gosto
pelo trabalho e, a partir daí, nunca mais deixou o comércio, função que exercia
paralelamente às suas atividades políticas, que viriam após seu casamento com
Lauro Arruda Câmara, filho do também “coronel” Antônio Arruda Câmara, então
prefeito de Nova Cruz, nos idos de 1935.
Enquanto continuava, mesmo casada,
morando na fazenda como uma espécie de executiva do pai, cuidando dos seus
negócios, Lauro, o marido, também entrava para o comércio, abrindo uma loja que
seria a semente de uma pequena cadeia de pontos de venda em Nova Cruz, Tácima,
Santo Antônio, Campestre, Passa e Fica e Serra de São Bento.
Dona Joanita na sua loja ao lado da sua nora Valéria Vieira Arruma Câmara
Apesar das
atividades comerciais do casal, Joanita despertava para a política pela maneira
cativante de atender o público. Estava sempre nas lojas, durante as feiras da
região, vendendo tecidos, chapéus e, posteriormente, eletrodomésticos,
tornando-se uma das principais do Agreste. Com a redemocratização do país em
1945, quando já demonstrava uma liderança emergente, lançou a candidatura do
marido Lauro Arruda a prefeito de Nova Cruz, em 1948, pelo Partido Social
Democrático.
Seus adversários da UDN, tendo à frente Djalma Marinho, lançaram
como candidato o pai de Joanita, o coronel “Totó Jacinto”, deixando-a numa
encruzilhada crucial entre o marido e o pai. Joanita manteve o apoio ao marido,
que foi eleito prefeito, mas aprendeu a lição de que “não se faz política sem
vítima”, mesmo sendo da própria família. Em 1950, Lauro se elege como um dos
deputados mais votados do Estado, novamente com o apoio ostensivo da mulher,
que já tinha uma liderança consolidada, apesar de não ter disputado ainda
nenhum cargo público.
O marido tentou fazê-la prefeita de Nova Cruz, quando
renunciou ao mandato para assumir a Assembléia Legislativa, mas sua candidatura
foi impugnada. Joanita só entraria para a vida pública em 1952, quando se
elegeria vereadora em Nova Cruz. Seis anos depois, foi eleita prefeita da
cidade, coroando, assim, a sua liderança política já reconhecida até mesmo
pelos adversários.
Em 1960, Joanita Arruda Câmara enfrentava o candidato da
UDN, Djalma Marinho, filho de Nova Cruz (nascera em Campestre, na época
pertencente ao município), apoiando o candidato Aluízio Alves, que, com o
patrocínio do PSD, viabilizou sua candidatura ao governo. Para desafiar o
adversário, mandou colocar nos jardins de sua casa uma faixa desafiadora, com
grande visibilidade, que dizia: “Nova Cruz confia no filho de Angicos”.
A frase
repercutiu por toda a região chegando até a capital, para irritação do
candidato da terra, o deputado federal Djalma Marinho, que costumava dizer em
seus comícios uma frase de sua predileção: “Nova Cruz não é apenas a minha
fortaleza política; é o meu próprio coração”. Djalma ganhou a eleição com uma
maioria superior a 300 votos. Joanita Arruda Câmara governou a cidade enfrentando
grandes dificuldades.
Em primeiro lugar, a seca que ameaçava dizimar vidas pela
fome e, em segundo lugar, por ser o governador Dinarte Mariz seu adversário
político. Enfrentou a seca com os poucos recursos da Prefeitura e o sacrifício
do patrimônio da família. Apesar de ter tido uma participação atuante e
destacada na vitória da “Cruzada da Esperança” e contar com o apoio da UDN ao
seu candidato a prefeito, Geraldo Guerra, parte do governo que ajudara a eleger
incentivou a candidatura do vereador José Peixoto, que viria a se eleger, para
surpresa de muitos, quando o candidato da prefeita tinha o apoio das
tradicionais lideranças locais. Começara aí o declínio político de d. Joanita
Arruda Câmara. Eleita vereadora, por duas vezes mais, chegou a tentar a
Prefeitura em 1968, mas foi derrotada.
Da esquerda para direita: Aluísio Alves, Joanita Arruda Câmara, Edite Souto e Ozelita Cascudo Rodrigues
Foi sua última campanha como candidata
pela Arena verde, liderada pelo ex-governador Aluízio Alves. Com a cassação de
Aluízio Alves, em 1969, ligou-se ao MDB e foi fiel até a morte à liderança
dele. Ele costumava fazer deferências à sua amiga e aliada e, por duas vezes, a
consultou sobre decisões políticas: primeiro, se deveria trocar o MDB pelo
Partido Popular, de Tancredo Neves; e, depois, sobre a viabilidade da candidatura
de Agenor Maria ao Senado da República, em 1974. Aluízio conhecia a
sensibilidade política de Joanita, que guardava sintonia com as aspirações
populares, além de ter convivido com velhas raposas políticas do PSD, como João
Câmara, Georgino Avelino, Dioclécio Duarte, Theodorico Bezerra, dentre outros.
A cidade de Nova Cruz parou para assistir ao seu sepultamento. Pela primeira
vez a “Rua do Sapo”, zona do meretrício, não funcionou. Seguindo seu exemplo,
bares, restaurantes e lanchonetes também cerraram suas portas. A cidade
homenageava a “protetora dos pobres”, que a chamava de “mãe gorda”. A atitude
da cidade sensibilizou seus familiares, que ouviram depoimentos comoventes de
gente humilde a quem ela protegia e ajudava já no ocaso da sua vida pública. Os
filhos Leonardo Arruda Câmara, deputado estadual, e Cid Arruda Câmara, prefeito
de Nova Cruz, são os sucessores dos pais na saga política, iniciada por seus
ancestrais há quase 70 anos. Dona Joanita morreu em 29/04/1993.
Atualmente em Nova Cruz tem duas instituições de ensino que homenageiam a ex-prefeita Joanita Torres Arruda Câmara com o seu nome que são eles o CAIC que fica localizado no Bairro Frei Damião,e a Creche localizada na Rua Frei Serafim de Catânia em Nova Cruz.
Extraído do livro
“Resgate da Memória Política”, de autoria de João Batista Machado, Natal-RN,
Departamento Estadual de Imprensa, 2006, 452 ps.
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