A brasileira que os jornais esconderam. Por Moisés Mendes. Foto: Reprodução
O jornalista Moisés Mendes
escreve sobre Txai Suruí, que desapareceu dos jornais brasileiros. Ele fez suas
pontuações em seu blog. Confira.
Não,
esta bela foto de Txai Suruí em Glasgow não é de nenhum grande jornal
brasileiro. É de uma reportagem do The New York Times sobre a brasileira que
brilhou na abertura da COP26.
Enquanto Txai Suruí discursava para os líderes mundiais,
em defesa da Terra, dos povos e dos bichos das florestas, o presidente do
Brasil fazia turismo na Itália ao lado do filho Carluxo e de um grupo de
militares.
A foto é de Oli Scarff, da France-Presse/Getty Images.
Nenhum dos grandes jornais brasileiros, nenhum, deu na capa a foto de Txai
Suruí. Nem essa, nem a do discurso. Deram só nos cantinhos. Essa aí, tirada do
NYT, também está no UOL.
A brasileira que falou para o mundo mora em Rondônia,
tem 24 anos, é do povo Paiter Suruí e fundadora do Movimento da Juventude
Indígena no Estado. Txai é estudante de Direito.
O único jornal online da grande imprensa que deu ontem
na capa do site a foto de Txai Suruí discursando em Glasgow foi o Globo. Só os
jornais e sites independentes, além dos blogs, destacaram a presença da
estudante.
Hoje, nenhum dos grandes jornais deu a imagem na capa em
suas versões impressas.
Nos anos 70, nos piores momentos da ditadura, quando as
redações eram tomadas por militantes ambientalistas, é quase certo que Txai
Suruí seria imposta aos editores pelos repórteres de ecologia (como eram
chamados) como imagem de capa.
Hoje, não. Txai Suruí somente sairia na capa dos jornais
se estivesse vestindo uma camisa do Flamengo com a propaganda das lojas do véio
da Havan.
Abaixo, o discurso que a brasileira fez na aberta da
conferência:
“Meu nome é Txai Suruí, eu tenho só 24, mas meu povo
vive há pelo menos 6 mil anos na floresta Amazônica. Meu pai, o grande cacique
Almir Suruí me ensinou que devemos ouvir as estrelas, a Lua, o vento, os
animais e as árvores.
Hoje o clima está esquentando, os animais estão
desaparecendo, os rios estão morrendo, nossas plantações não florescem como
antes. A Terra está falando. Ela nos diz que não temos mais tempo.
Uma companheira disse: vamos continuar pensando que com
pomadas e analgésicos os golpes de hoje se resolvem, embora saibamos que amanhã
a ferida será maior e mais profunda?
Precisamos tomar outro caminho com mudanças corajosas e
globais. Não é 2030 ou 2050, é agora!
Enquanto vocês estão fechando os olhos para a realidade,
o guardião da floresta Ari Uru-Eu-Wau-Wau, meu amigo de infância, foi
assassinado por proteger a natureza.
Os povos indígenas estão na linha de frente da
emergência climática, por isso devemos estar no centro das decisões que
acontecem aqui. Nós temos ideias para adiar o fim do mundo.
Vamos frear as emissões de promessas mentirosas e
irresponsáveis; vamos acabar com a poluição das palavras vazias, e vamos lutar
por um futuro e um presente habitáveis.
É necessário sempre acreditar que o sonho é possível.
Que a nossa utopia seja um futuro na Terra.
Obrigada!”
0 Comentários