A Petrobras vendeu o Polo
Potiguar, que inclui a refinaria
Clara Camarão, em Guamaré, e poços de exploração de petróleo no Rio
Grande do Norte, por menos da metade do preço que os ativos valiam. É o que
indicam documentos oficiais inéditos obtidos pela reportagem do AGORA
RN.
Enquanto o Polo Potiguar foi
negociado com a 3R Petroleum por
US$ 1,3 bilhão, os ativos valiam R$ 2,7 bilhões, segundo estimativas divulgadas
pela própria Petrobras.
A privatização do Polo
Potiguar ocorreu durante a gestão do ex-presidente Jair
Bolsonaro (PL). Após um longo trâmite, a 3R Petroleum assumiu
a gestão dos campos e da refinaria no início do mês passado. Desde então, a
empresa tem aumentado consecutivamente os preços da gasolina e do diesel
vendidos para o mercado potiguar. Hoje, o preço praticado é cerca de R$ 0,80
por litro mais caro que em estados vizinhos como a Paraíba.
Dados acessados pela
reportagem apontam que, antes de negociar os ativos com a 3R Petroleum,
a Petrobras deu início ao processo de renovação da apólice de seguro de
centenas de seus ativos no País, entre eles os do Polo Potiguar. Nessa
negociação, o valor estimado para os 68 ativos chama a atenção por superar
muito o da venda propriamente dita.
Com a discrepância entre o valor dos ativos para venda e o considerado para cálculo do seguro, a Petrobras pode ter tido um prejuízo de US$ 1,4 bilhão.
Refinaria Clara Camarão,
no RN. Foto: Arquivo
Seguro
Os documentos de posse do AGORA RN apontam
que, no dia 18 de julho de 2022, a Coordenação de Seguros Nacionais da
Petrobras enviou para a Fairfax Brasil Seguros Corporativos S.A. – seguradora
com sede em São Paulo – uma manifestação de interesse na renovação da apólice
de seguro de risco operacional de diversos de seus ativos espalhados pelo país.
Entre centenas de outros ativos da estatal em diversos
estados brasileiros, 68 ativos que compõem grande parte do patrimônio vendido
junto ao Polo Potiguar estão relacionados, em uma tabela anexa na qual a
própria Petrobras informava quanto valiam seus bens vendidos à 3R Petroleum.
Os 68 ativos eram avaliados pela Petrobras em mais de US$
2,7 bilhões. O Polo Potiguar foi vendido à 3R Petroleum por metade disso.
Advogados, contadores e até vendedores de seguro consultados pela reportagem
afirmam que, das duas uma: ou o valor dos ativos era realmente mais que o dobro
do valor pelo qual foram vendidos ou houve fraude no pedido de renovação do
seguro.
Sozinho, o Ativo Industrial de Guamaré (Refinaria
Potiguar Clara Camarão – RPCC) já valeria – segundo a avaliação da própria
Petrobras – mais que o preço de venda de todo o Polo Potiguar: US$ 1,4 bilhão.
Ainda, no montante avaliado para fins da renovação da
apólice, não constavam diversos outros bens que também foram vendidos no
pacote. É o caso das tubulações de escoamento de petróleo, dos gasodutos e do
vaporduto, de milhares de unidades de bombeio que custam individualmente US$ 50
mil, de geradores móveis, subestações elétricas e outros tantos equipamentos e
estruturas.
Petrobras não explica divergência entre valor do seguro e da
venda do Polo Potiguar
A Petrobras nunca tornou públicos – nem mesmo a
funcionários de seu alto escalão que foram ouvidos pela reportagem – os
critérios detalhados que foram aplicados para se estabelecer os valores de
venda do Polo Potiguar.
Solicitada a divulgar o conteúdo do pedido de renovação
da apólice, por meio do Portal de Transparência da Petrobras e com base na Lei
de Acesso à Informação (12.527/2011), a estatal também se recusou a responder,
alegando sigilo.
Em resposta, a estatal declarou que “este documento
possui informações comercialmente sensíveis e estratégicas cuja eventual
publicidade tem o condão de prejudicar a atuação empresarial da companhia e,
ainda, comprometer futuros procedimentos que tenham por objeto a contratação de
seguros”.
Fala ainda que “o fornecimento de informações contida na
documentação não pode ser disponibilizada a uma pessoa em específico, sob pena
de levar a uma assimetria de informações”.
“Ressalta-se que, de acordo com inciso I, do art. 14, da
recente Lei nº 13.303/2016 (Lei das Estatais), devem ser protegidas as
informações que possam ter influência no mercado, pois o conhecimento de tais
dados por terceiros poderá gerar um desequilíbrio, conferindo vantagem a quem
tiver acesso”, enfatiza a empresa.
Em novembro do ano passado, em resposta a uma matéria que
já chamava a atenção para a diferença entre os preços cotados para o seguro e o
de venda dos ativos, a Petrobras declarou ao site Poder 360 que “o valor de um
ativo para efeito de seguros é baseado no ‘valor de reposição’, ou de
reconstrução do bem. Já o valor de alienação de um ativo é estimado por meio da
metodologia de Fluxo de Caixa Descontado Esperado, ou seja, no valor econômico
daquele bem”.
Contudo, a Petrobras nunca apresentou os números que
resultariam da segunda metodologia. Igualmente não respondeu às críticas que
apontam que, ao contrário do sugerido, pelo critério do valor econômico real,
Polo Potiguar valeria ainda mais.
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